MENSAGEM de Fernando Pessoa; Terceira Parte- O ENCOBERTO
Segundo- OS AVISOS
Terceiro
.Ouça aqui o poema (para estudantes de português)  
(TERCEIRO AVISO)
'Screvo meu livro à beira-mágua.
Meu coração não tem que ter.
Tenho meus olhos quentes de água.
Só tu, Senhor, me dás viver.

 

Só te sentir e te pensar
Meus dias vácuos enche e doura.
Mas quando quererás voltar?
Quando é o Rei? Quando é a Hora?

 

Quando virás a ser o Christo
De a quem morreu o falso Deus,
E a despertar do mal que existo
A Nova Terra e os Novos Céus?

 

Quando virás, ó Encoberto,
Sonho das eras portuguez,
Tornar-me mais que o sopro incerto
De um grande anceio que Deus fez?

 

Ah, quando quererás, voltando,
Fazer minha esperança amor?
Da névoa e da saudade quando?
Quando, meu Sonho e meu Senhor?

Comentários:

Neste Terceiro Aviso, único poema de Mensagem que não tem nome, Fernando Pessoa fala como sucessor do Bandarra e do Padre António Vieira: também ele anuncia a boa nova, o advento do Rei que conduzirá Portugal ao Quinto Império. Anuncia-o, não como profeta ungido (que só o Bandarra teria sido, já que Vieira derivou as suas conclusões das trovas do antecessor e das Sagradas Escrituras) mas como Homem de Razão que sabe e que espera (e desespera, como acentua). A ter nome, o poema chamar-se-ia "Fernando Pessoa" e por isso o não tem!

"Senhor"- O Encoberto, também chamado "Rei"..

"dias vácuos"- dias monótonos, vazios.

"o Cristo de a quem morreu o falso Deus"- o meu Cristo. Pessoa não acreditava no Deus da Igreja Católica Romana, nem na divindade do seu Cristo que com Ele se confunde (o "falso Deus").

"a Nova Terra e os Novos Céus"- o Quinto Império (referência à expressão usada na 2ª Epístola de S.Pedro para designar o Terceiro Mundo- ver o comentário ao poema "Antemanhã").

"sonho das eras português"- sonho secular dos portugueses.

"tornar-me mais que o sopro incerto de um grande anseio que Deus fez"- Quando Pessoa se refere a Deus, refere-se ao Criador (em que acreditava) e Arquitecto do Destino. Aqui ele diz-nos que com o advento do Encoberto, que esperava para os seus dias, ele tornar-se-ia mais do que a voz quase inaudível que exprimia um sonho nacional.

.Ouça aqui o poema (para estudantes de português) .
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Lisboa, Portugal. Dezembro 20, 2003
 
Revisto Janeiro 13, 2004
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João Manuel Mimoso
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English version

An introduction to the poem: The set of three poems, called "The warnings", begins with a poem dedicated to Bandarra, the XVI century shoemaker turned prophet whom interpreters credit with foretelling accurately the coming of a period when Portugal was under Spanish rule, the subsequent 1640 revolution and liberation under king John IV. The same Bandarra is said (by a miracle of interpretation) to have foretold a future supremacy of Portugal among nations. The second poem is dedicated to father Antonio Vieira who was the true theoreticist of the Fifth Empire to which Portugal (and the world) would be lead by a great king. Finally, the third poem does not have a name (the only nameless poem in Mensagem) because the third prophet, the man who voices the third warning, is Fernando Pessoa himself! He says he is waiting for the King, which tradition says will come in a misty morning, and he is despairing of witnessing his advent in his own time...

Third Warning

I write my book at the brink of despair.
My heart has nothing to hold.
I have my eyes warm with water.
Only you, Lord, give me a reason to live for.

 

Only the feeling and thinking of you
Fills and gilds my empty days.
But when will you want to return?
When is the King? When the Hour?

 

When will you come to be the Christ
Of one on whom the false God died,
And to awaken, from the evil of today,
The New Earth and the New Skies?

 

When will you come, oh Hidden One,
Dreamed by Portuguese of all eras,
To turn me into more than the uncertain breath
Of a great yearning that God inspired?

 

Ah, when will you wish, by returning,
Turn my hope into love?
From the mist and the yearning, when?

When, my Dream and my Lord?